“Perder pessoas” é uma expressão que, quando se lê de relance, soa mal. Magoa. Estranha-se. E, ao contrário do provérbio, nem sempre se consegue entranhar. Pelo menos quando aparece como um ato isolado, único, desprendido.

Vivemos. Fazemos vida. Somos vida. Vida em nós e nos outros. E é nesses momentos, em que pensamos naquilo que fazemos em vida e da vida, que nos apercebemos de que “perder pessoas” causa-nos, por vezes, sentimentos eternos, daqueles que se arrastam, que corroem, que não doem sempre, mas que se esmorecem num corpo e dificilmente o abandonam. Como ervas daninhas que se multiplicam sem quê nem porquê.

“Perder pessoas” é senti-las abalar mesmo quando continuam ali ao lado – num outro lado. É quando um coração se despega do outro, levando consigo memórias, momentos e, mais intenso do que tudo isto, quando leva atrás de si uma multiplicação de circunstâncias que, por mais que tentes, não se desligam.

“Perder pessoas” pode ser mais intenso do que a morte terrena. É a sensação de vazio quando a vida que era nossa, connosco e por nós é agora um horizonte – distante, relutante, auspicioso, lá longe.

“Perder pessoas” pode ser o equivalente a perder sonhos. E cada sonho que não amanhece é uma parte de nós que se vai. Os sonhos constroem-se, imaginam-se, idealizam-se e depois, bem depois, em algumas ocasiões, de forma egoísta, desaparecem, voam, seguem novas paragens.

E a vida também é, talvez, um “perder”. Fechar umas portas. Abrir outras. Despedirmo-nos de uns. Acatarmos outros. Aceitarmos a diferença e vivermos com ela. Como se a nossa melhor companhia fosse a capacidade de aceitação daquilo que o outro é e daquilo que sou. Com a intrínseca certeza de que melhorar diariamente é um caminho.

E mesmo assim, mesmo com os sentidos em equilíbrio, “perder pessoas” será sempre um desgaste. De emoções. De sentimentos.

Às vezes somos a vida. Outras, porém, mais desprovidas de sentido e de razão, somos a realidade que já foi presente e que agora, bem agora, dá lugar à fugacidade das lembranças. Também somos lugares. E cheiros. E cantinhos a descobrir. Milímetro a milímetro, como quem percorre um terreno germinado de sensações.

E viver é ser de alguém, por alguém e com alguém. Por escassas ocasiões de nenhuma pessoa. De nós. De um interior que cresce e esmorece, floresce e engradece, bem ao jeito de um mundo perdido que se funde e se encontra em olhares.

Somos na vida dos outros a busca – de um terreno fértil. Sem escárnio. Sem maldizer. Sem menosprezar. Somos também aquilo que nos ocupa o coração. Somos a grandeza das razões e o alerta da necessidade do próximo. Somos gargalhadas riscadas de alegrias. E, quando preciso, verdades mais duras envoltas de razão.

A sorte, a grande sorte, é que, também na vida, o antónimo de “perder” é sempre, mas sempre, “encontrar”.
Encontrar pessoas.

PERDER PESSOAS por João Baptista
http://mariacapaz.pt/cronicas/perder-pessoas-por-joao-baptista-quota-parte/

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