«O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer!» É isto que eu não entendo - mas a culpa não é tua. 
José Saramago 

Não se sabe tudo, nunca se sabe tudo, mas há horas em que somos capazes de acreditar que sim, talvez porque nesse momento nada mais nos podia caber na alma, na consciência, na mente, naquilo que se queria chamar ao que nos vai fazendo mais ou menos humanos.
 José Saramago

Todo o tempo passado a trabalhar. Todo o tempo passado a falar com gente cheia de aspirações concretas. A esgravatar caminhos alternativos ao caminho que desde sempre soube e é o meu. Todo o tempo sóbrio, bêbedo, acordado, aqui. Fora da minha nuvem, Britânia imaginária. Todo o tempo perdido. Tanto. Roseiras por enxertar. Trutas à deriva. Bibliotecas de couro. Cavernames. Oboés doidos na charneca fria. Nunca os tocarei. O Tempo, indemne, não indemniza. Não se desdobra. Não se recupera. Resta-me ronronar e gemer. Ser gato. Exprimir o inefável com um orgulho estóico mas envelhecido. Tardio. O pêlo caindo. A pele demasiado larga para a carne. Peritonite infecciosa felina. O fim a instalar-se por toda a parte. O olhar triste. A espera. A inevitabilidade. Não conseguir saltar, e saltar. O sonho. A sublime humanidade dos bichos. A redenção. Privada. Como uma cicatriz que torna a pele única e intransmissível e, por isso mesmo, mais bonita.
Miguel Martins, Lérias. Averno 2011

 De vez em quando acerca-se de mim uma noção muito clara: eu não fui feita para viver. Sempre houve alguma coisa que me faltou. Sempre presente, desde que me lembro, esta incapacidade de ser confortavelmente social, de me adaptar com naturalidade às coisas. Uma estranheza particular. Uma solidão particular. Por vezes o desajuste é tão profundo que tenho vontade de deixar a vida pousada sobre a cómoda do quarto
e sair de mansinho, sem ninguém dar por mim.
Desconhecido


 The Death of Marat, 1793. Oil on canvas.
Jacques-Louis David

Não temo que um dia me esqueça de uma palavra, de uma data, de uma pessoa ou de algo que tinha para fazer. Temo sim que um dia tudo aconteça com normalidade e eu nem repare que me estou a esquecer de algo.
Desconhecido 

 eu não te posso dar aquilo que nunca tive de ti
mas não te vou negar a visita às ruínas que deixaste em mim
 Linda Martini-Amor Combate

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